A
Lei 10.639 de 09 de Janeiro de 2003, hoje com 10 (dez) anos, é um marco na
História da Educação do país, ela simboliza dois pontos essenciais: o de
chegada das lutas antirraciais na escola e o de partida da escola para a
renovação da qualidade social da educação brasileira. Ela significa o
estabelecer de novas diretrizes e práticas pedagógicas que venham possibilitar
o reconhecimento da importância d@s african@s e afrobrasileir@s no processo de
formação nacional.
Esta
Lei deveria estar sendo encarada como parte fundamental do conjunto das
políticas que vislumbram uma educação de qualidade como direito de tod@s. Desde
a sua promulgação, um decênio já se passou e ela ainda não passa de
“letra-morta”, (até porque, lei não significa consciência, ela pode apenas
provocar essa conscientização.) e isso acontece pelo simples fato da escola ser
um campo com sequelas profundas de racismo, e que, podemos dizer, sem medo de
errar, “que ela ainda é o maior veículo de comunicação da ideologia branca”,
dado que, ainda hoje nos deparamos com livros didáticos trazendo conteúdos de
uma concepção positivista da historiografia brasileira a qual só valoriza,
feitos e fatos dos brancos escamoteando assim a participação e importância de
outros segmentos da sociedade a exemplo, os negros. Sem contar que ainda é
muito comum, ver a escola abordando a cultura africana em datas específicas, e
o pior, a partir de um olhar folclorizado e pitoresco, tratando-a como simples
herança deixada pelos negros e, dando ao europeu a condição de portador de uma
cultura superior e civilizada.
Para
que tudo isso possa mudar, duas frentes de batalha deverão ser organizadas, uma
composta pel@s profissionais da educação e a outra pelos representantes dos
órgãos governamentais.
A de trabalhador@s da educação
porque precisamos entender que a escola precisa mudar, e que essa mudança
começa em cada um de nós. Que o nosso fazer pedagógico deve refutar as práticas
de discriminação, que o nosso trabalho deve sim ser redefinido e aperfeiçoado,
deve passar a conter representações diferentes das já estabelecidas e
divulgadas pela tradição. “A reflexão crítica sobre a prática se torna uma
exigência da relação teoria/prática sem a qual a teoria pode ir virando
blábláblá e a prática ativismo”.
Porque precisamos entender que as
evidências do processo discriminatório operam sim no sistema de ensino e que
elas penalizam diretamente crianças, adolescentes, jovens e adultos negros
levando-os a evasão e ao fracasso escolar de fato. Sabe-se hoje, que existe
correlação entre o pertencimento etnicorracial e sucesso escolar, indicando,
portanto, que se faz necessário uma forte determinação para que a diversidade
cultural brasileira passe a integrar o ideário educacional, não como um
problema, mas, como um rico acervo de valores, posturas e práticas que devem
conduzir ao melhor acolhimento e maior valorização dessa diversidade no âmbito
escolar.
Precisamos nessa frente de trabalho,
compreender que o conhecimento da História da África e d@s negr@s poderá
contribuir para se desfazer os preconceitos e estereótipos ligados ao segmento
afro-brasileiro, além de contribuir para o resgate da autoestima de milhares de
crianças e jovens que se veem marginalizados por uma escola de padrão
eurocêntrico que nega a pluralidade étnico-cultural da nossa formação.
A segunda frente, que deverá ser
composta pelos representantes dos órgãos governamentais, nessa fase,
especificamente por prefeitos no sentido do comprometimento com a criação de um
Órgão (coordenação/diretoria/secretaria) para trabalhar a Promoção da Igualdade
Racial; por vereador@s que possam apresentar Projetos de Leis para programar,
regularizar e aplicar na Rede Municipal de Ensino a Lei nº 10.639/2003; por Secretári@s
de Educação que se comprometam em fornecer condições necessárias à
aplicabilidade da lei nas escolas e que, possam ainda firmar convênios/parcerias
com outras instituições governamentais e não governamentais, para cursos de
extensão, especialização... Para @s trabalhador@s em educação sobre a cultura
da áfrica e da Cultura Afro-brasileira, e que esses componentes possam ainda
incentivar a publicação de material didático que possa vir a dar suporte
técnico para a atuação d@s docentes no processo de ensino e de aprendizagem.
Essas duas frentes com certeza em
muito poderá contribuir com o “desmanche” do maior gargalo do sistema
educacional brasileiro que como sabemos, reside na qualificação do corpo
docente, sobretudo os que exercem o magistério nas séries iniciais e que
precisam estar habilitados em trabalhar com essa nova temática, que, por se
tratar de uma temática interdisciplinar e não de uma disciplina específica
requer muito mais esforço pois a lei determina que os conteúdos referentes a
História da África e Cultura Afro-Brasileira sejam trabalhadas no contexto de
todo o currículo escolar.
Por fim, digo que, sem sombras de
dúvida a Lei 10.639 representa um grande avanço, pois possibilita a construção
de um multiculturalismo crítico da escola brasileira ao tempo em que reconhece
uma luta histórica do Movimento Negro no Brasil, no entanto, muito ainda
precisa ser feito para que a lei saia do estado de “letra-morta” em que se
encontra e venha a viver no fazer de uma educação multicultural contribuindo
assim, na construção de uma sociedade justa.
Adilza
Cristina da Silva
Professora
Especialista
em Programação do Ensino de História
Militante
dos Movimentos Sociais
Colaboradora
do Projeto Social do Ilê Axé Oyá Ogumtô
Belo
Jardim - PE
Um comentário:
Muito bom o post!
Parabéns Adilza!
Flores na vida e força pra luta!
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